ENTREVISTA EXCLUSIVA COM TOMMASO DEVITO
2021-02-09
Tommaso Devito, também conhecido por Nuclearpasta, é um ilustrador e banda desenhista italiano sediado em Milão. Este autor está neste momento a publicar online a sua BD digital Ten Earth Shattering Blows. Iniciado em 2017, este webcomic no género da fantasia conta a estória de Landabella Trastan, uma jovem da nobreza da rica cidade de Vezenia, que viaja pelo deserto com uma escolta reduzida. A sua missão – matar a bruxa má que reside na fortaleza de Saltfall – irá dar início a uma louca aventura que a levará a conhecer-se a si própria e o mundo que a rodeia. Entre escravos implacáveis e saqueadores montados em lagartos, Landabella Trastan irá descobrir que a autoridade do seu status de nobre não vale nada numa terra implacável onde não lei nem piedade.
+info: tenearthshatteringblows.com
Tommaso Devito, também conhecido por Nuclearpasta, é um ilustrador e banda desenhista italiano sediado em Milão. Este autor está neste momento a publicar online a sua BD digital Ten Earth Shattering Blows. Iniciado em 2017, este webcomic no género da fantasia conta a estória de Landabella Trastan, uma jovem da nobreza da rica cidade de Vezenia, que viaja pelo deserto com uma escolta reduzida. A sua missão – matar a bruxa má que reside na fortaleza de Saltfall – irá dar início a uma louca aventura que a levará a conhecer-se a si própria e o mundo que a rodeia. Entre escravos implacáveis e saqueadores montados em lagartos, Landabella Trastan irá descobrir que a autoridade do seu status de nobre não vale nada numa terra implacável onde não lei nem piedade.
+info: tenearthshatteringblows.com
Entrevista
Qual é a tua primeira memória de ler banda desenhada? Quem ta deu? E como descobriste que a BD é um bom medium para contares as tuas estórias? Surgiu da tua cabeça como a deusa Atenas ou foi inserido na tua mente?
Quando era criança um amigo convenceu-me a comprar uma revista do Rato Mickey. Foi tipo "Ugh, ler é uma treta, é aquela coisa que te obrigam a fazer na escola!" Eu estava muito, muito errado. Ainda me lembro do título da primeira estória: Tio Patinhas e o Sono Instrutivo. Os livros de BD são como filmes que podes fazer sozinho com apenas um lápis e um pedaço de papel. Todo a gente gosta de filmes! Isso foi, não sei, eu tinha sete anos? Tenho desenhado BD desde então.
Tiveste uma educação formal em artes ou és autodidata?
Fui para a escola de artes e acompanhei uma aula de banda desenhada. Recebi algumas dicas, mas nada que não pudesse aprender sozinho. É principalmente muita paixão e exercício constante.
O teu estilo é uma mistura de manga e BD franco-belga. Quais foram as tuas principais fontes de inspiração para Ten Earth Shattering Blows?
Tens razão. Li muita manga ao longo da minha vida, sempre admirei o dinamismo que eles imprimem na cena. Acho que isso transparece na minha narrativa e em certas convenções visuais. Além disso, o meu pai apresentou-me o Moebius e foi amor à primeira vista. Para além da BD, eu vejo muitos filmes e minha lista do YouTube está cheia de ensaios-vídeo sobre técnicas de direção. Tento não pensar muito sobre estilo porque isso me leva à frustração e à dúvida. Todos os dias encontro artistas incríveis que gostaria de imitar, mesmo que o seu estilo seja completamente diferente do meu. Eu prefiro concentrar-me em contar estórias e deixar o meu subconsciente trabalhar o meu estilo.
O teu storyworld é muito interessante e, como um de teus leitores o descreveu, é uma espécie de híbrido entre Mad Max e os Flintstones. Quando trabalhas o teu webcomic preferes construir o mundo ficcional (worldbuilding) ou contar a estória (storytelling)?
Gosto dos dois mas, quando contas uma estória, tens de colocar a narrativa em primeiro lugar. Há sempre o risco de ficares muito apaixonado pelo mundo que criaste ao ponto de quereres contar ao leitor qualquer minúcia irrelevante, às custas do ritmo. Ninguém gosta de info dumps. É mais eficaz sugerir a presença de uma tradição rica sem entrar em detalhes.
Qual foi o teu processo criativo para a construção do mundo de Ten Earth Shattering Blows? Como e onde fizeste a pesquisa para criar e projetar o teu mundo ficcional?
Se bem me lembro tudo começou com o sistema de magia, por isso foi imediatamente uma estória de fantasia. Eu quero que a magia seja estranha e assustadora e tenha uma sensação “tangível”. Já existem muitos personagens com bolas brilhantes de energia nas suas mãos na fantasia popular, eu não quero seguir esse caminho. Uma das minhas bandas desenhadas favoritas, Dorohedoro, de Q Hayashida, tem exemplos fenomenais do tipo de magia que procuro. Decidi, desde o início, num cenário de deserto porque sempre gostei da estética pós-apocalíptica de Mad Max e Hokuto no Ken. Mas, a determinada altura, esta era a estória de um grupo de bardos e bufões que roubam os seus patronos. Atiro ideias ao ar e vejo o que resulta. O que não resulta pode ser reciclado para outro projeto. O que realmente me preocupa no worldbuilding é projetar as coisas mundanas, coisas que talvez não existam mas que devem dar a sensação de que poderiam existir. Pesquisar pode tornar-se um trabalho a tempo integral e ninguém pode despender todo esse tempo. Não sei como muitas coisas funcionam: como as armaduras se mantém unidas? Como uma catapulta funciona? Como posso juntar engrenagens, cordas e polias para projetar uma máquina credível?
Quais foram os temas, ideias e conceitos narrativos que mais te interessaram ao desenvolver o mundo de Ten Earth Shattering Blows? Porque decidiste contar esta estória neste gênero (fantasia)?
Tenho conceitos diferentes em mente e eles são sempre fantasia ou ficção científica. A razão muito enfadonha pela qual escolhi 10ESB é porque acho a fantasia mais fácil de desenhar e não queria começar a minha jornada na BD serializada da forma mais difícil (se cordas e roldanas são difíceis, imagina uma estação espacial!). 10ESB é uma estória de ação em primeiro lugar e a narrativa é quase inteiramente visual. Soube imediatamente que não podia ter nenhum monólogo interno a decorrer. Cada emoção deve aparecer no rosto dos personagens, cada intenção deve ser mostrada por meio das suas ações. Neste momento, ainda estou na minha fase infantil, onde brinco com monstros e armas grandes (e fazendo todos os barulhos com a boca). A partir do próximo capítulo haverá espaço para sentimentos e introspecção. Esta é realmente uma estória madura, mas ninguém sabe ainda!
Gostas do processo de escrita? Como escreves o guião? Usas o formato de BD ou o formato de cinema?
Em primeiro lugar sou escritor. Eu podia desistir de desenhar mas continuaria a escrever. Tecnicamente eu não escrevo para o meu webcomic: os meus layouts são o guião. Às vezes anoto diálogos para cenas futuras num ficheiro txt, o único tipo de escrita preliminar que faço.
Como fazes o storyboard e o layout das tuas páginas? Qual é o seu processo criativo do início ao fim ao fazeres uma página? Usas apenas ferramentas digitais ou é um processo híbrido?
É tudo digital. Os meus layouts são uma confusão: já que sou a única pessoa que precisa de os ver posso fazer o mínimo possível (isto não é totalmente verdade, os meus patronos também os veem, eu devia ter vergonha). Normalmente faço o layout de várias páginas de uma vez, pois tenho de decidir o ritmo geral da cena e estou determinado a obter o máximo dos cliffhangers na viragem das páginas (com a perspetiva de um futuro livro físico). Este é o momento em que crio todos os diálogos e os escrevo nas páginas, mais ou menos onde os balões de fala estarão. Preciso de silêncio absoluto quando faço os layouts ou não consigo concentrar-me, e estou constantemente a levantar-me e a fazer pausas. Adoro o processo mas preciso de disciplina! Depois disso, posso relaxar. Eu faço desenhos a lápis muito detalhados o que compensa a confusão anterior. De seguida, arte final e cores, normalmente. Eu nunca me cronometrei, mas todo o processo para fazer uma página leva, em termos de tempo percepcionado, onze anos, mais coisa menos coisa.
Gostas de planos gerais com muito detalhe (uma espécie de ‘Onde está o Wally’ às vezes). Quais foram as coisas mais difíceis que tiveste de desenhar em Ten Earth Shattering Blows?
Epá, sinto que a coisa mais difícil de desenhar é sempre aquela que estou a desenhar no momento! Piadas à parte, planos gerais com muito detalhe não são necessariamente difíceis, demoram mais tempo. Às vezes fico preso na anatomia dos animais, especialmente se eles forem vistos de ângulos incomuns. As cores são meu verdadeiro inimigo. Eu passo por todas as cinco fases do luto todas as vezes que tenho de encontrar uma nova paleta de cores para uma cena. Há uma longa sequência de ações no capítulo um onde todos os fundos são vermelhos. Foi um pesadelo. Mas acabou sendo um dos meus momentos preferidos.
Desenhas muitos lagartos gigantes do deserto. Quando iremos ver serpentes gigantes do deserto, ou ratos canguru? E qual é a cena com os cefalópodes flutuantes?
Tenho algumas dúvidas sobre os ratos canguru, mas iremos ver outros animais de certeza. Os répteis são do Deserto, os mamíferos peludos são das Cidades Livres, ao norte, de onde vem Landa, a protagonista. Cada região possui um tipo específico de animal gigante. As águas-vivas voadoras são o meu mistério mais popular. Temo que poucos estejam realmente interessados na estória real: essas coisas no céu são os verdadeiros protagonistas!
Já pensaste em desenvolver um franchise transmediático com o mundo ficcional que criaste? Imaginas Ten Earth Shattering Blows ou outras histórias neste universo ficcional a serem adaptadas para outros media?
É a coisa mais cliché de todos os tempos para um webcomic mas eu quero escrever um RPG Ten Earth Shattering Blows. Esse tem sido um objetivo desde o início. Fora isso, não tenho planos. Mas a imaginação é livre e é a minha cena, então... sim, posso imaginar TUDO.
Porque todas as coisas chegam ao fim: quando pensas terminar Ten Earth Shattering Blows? E qual é o teu próximo projeto?
No ritmo atual levará vários anos. Espero ser capaz de acelerar o processo. Tenho um final em mente e não quero que pareça apressado, por isso vou levar todo o tempo que for preciso. Ainda não posso falar sobre todos os meus próximos, incríveis, espetaculares e diferentes projetos! Não me enganas.
No teu site partilhas alguns webcomics interessantes. Também recebes sugestões de novas estórias dos teus leitores, portanto, aqui vai: Kill Six Billion Demons, Tiger, Tiger, Eletric Bones, Green Monk e Of Stars Profaned. A propósito, quais são os últimos webcomics que leste e que não estão na lista no teu site?
Só conheço uma das sugestões. Depois de três anos ainda sou um recém-chegado. Não li muitos webcomics por isso as hipóteses de estar a perder estórias famosas que toda a gente conhece são grandes. Agradeço as sugestões! Para além dos que estão no meu site encontrei, recentemente, Unfiltr, de Crom Waits, Girl Noir, de Annie Raab e Eric Hibbeler, e Adesina and Armstrong, de Nesskain. Eles estão apenas no inicio por isso eu não sei muito sobre o enredo, mas a arte é excelente.
Entrevistador: Marco Fraga Silva
Artigo web: Sérgio Santos
Futuramente continuarão a ser publicadas entrevistas referentes a várias personalidades de destaque ligadas ao universo da BD.