RESENHA BD
Na Prisão, de Kazuichi Hanawa
20-06-2022
Já percebi que a Sendai vai ser uma editora responsável pela progressiva falta de espaço nas estantes da minha biblioteca. Até agora, tem sempre surpreendido com lançamentos inesperados, e imperdíveis, que nos trazem um manga diferente, mais independente e erudito, e experimentalista. É um sopro de diferença, num meio editorial que por cá, no que respeita à banda desenhada japonesa, vive essencialmente da exploração do comercialismo adolescente, polvilhado com alguns toques de autores mais literários. Nada contra estas escolhas, até porque têm o seu público, mas fazia falta o tipo de diversidade que a Sendai (e, de forma mais limitada, a Midori) nos está a trazer.
Um pormenor curioso sobre esta editora é que nunca sabemos bem o que esperar das suas edições. Arrancou com o horror visceral de Hino (que, pessoalmente, sempre achei impublicável por cá). Oferece-nos em seguida o surrealismo infantil de Sakabashira. E, na sua terceira edição por cá, novamente algo de inesperado: um mangá auto-biográfico, profundamente realista, entre o retrato social e a memória individual.
Já percebi que a Sendai vai ser uma editora responsável pela progressiva falta de espaço nas estantes da minha biblioteca. Até agora, tem sempre surpreendido com lançamentos inesperados, e imperdíveis, que nos trazem um manga diferente, mais independente e erudito, e experimentalista. É um sopro de diferença, num meio editorial que por cá, no que respeita à banda desenhada japonesa, vive essencialmente da exploração do comercialismo adolescente, polvilhado com alguns toques de autores mais literários. Nada contra estas escolhas, até porque têm o seu público, mas fazia falta o tipo de diversidade que a Sendai (e, de forma mais limitada, a Midori) nos está a trazer.
Um pormenor curioso sobre esta editora é que nunca sabemos bem o que esperar das suas edições. Arrancou com o horror visceral de Hino (que, pessoalmente, sempre achei impublicável por cá). Oferece-nos em seguida o surrealismo infantil de Sakabashira. E, na sua terceira edição por cá, novamente algo de inesperado: um mangá auto-biográfico, profundamente realista, entre o retrato social e a memória individual.
Na Prisão reúne um cojunto de pequenas vinhetas onde o autor, Kazuichi Hanawa, recorda a sua experiência como prisioneiro, tendo sido condenado por um crime ligado à posse ilegal de armas de fogo. O foco destas histórias prende-se com a experiência do dia a dia numa prisão japonesa. Tem um olhar clínico que se aproxima do sociológico e etnográfico na forma como detalha os pequenos pormenores da vida no cárcere. Bem como um curioso foco na comida prisional, que, pelo retrato que Hanawa faz, é muito apetecível. As regras do dia a dia, os pequenos prazeres, o passar dos dias, as tarefas, e a disciplina prisional são os temas das histórias que nos conta.
Talvez o aspeto que mais se destaca na leitura é o seu conformismo e resignação. Este não é um daqueles livros onde o dedo do autor se enristece face às injustiças do sistema, ou nos comiseramos com a miséria humana da vida dura dos prisioneiros. Apesar de ter sido condenado por aquilo que parece ser um crime menor, Hanawa escreve sob o que parece ser uma perspetiva de síndrome de estocolmo. Abraça o cativeiro, mostra, pelo desenho e narrativa, o esforço de disciplina e aceitação da punição, o rigor em manter-se um prisioneiro modelo. Com a individualidade rendida ao castigo, uma vida resumida ao passar dos dias, aos ritmos do cárcere, ao contar do tempo até ao regresso a uma liberdade que, face à intensa resignação, talvez se torne um fardo quando volta a ser sentida. O livro termina com um calmo desespero de resignação.
Desenhado com um estilo gráfico muito pessoal, Na Prisão lê-se como um exorcizar acrítico de memórias e experiências. Registo gráfico autobiográfico, procura serenidade e não a crítica profunda. Mostra-nos que, para muitos, e talvez também para o autor, a opressão do cárcere é uma libertação do fardo do ser.
Artur Coelho
Talvez o aspeto que mais se destaca na leitura é o seu conformismo e resignação. Este não é um daqueles livros onde o dedo do autor se enristece face às injustiças do sistema, ou nos comiseramos com a miséria humana da vida dura dos prisioneiros. Apesar de ter sido condenado por aquilo que parece ser um crime menor, Hanawa escreve sob o que parece ser uma perspetiva de síndrome de estocolmo. Abraça o cativeiro, mostra, pelo desenho e narrativa, o esforço de disciplina e aceitação da punição, o rigor em manter-se um prisioneiro modelo. Com a individualidade rendida ao castigo, uma vida resumida ao passar dos dias, aos ritmos do cárcere, ao contar do tempo até ao regresso a uma liberdade que, face à intensa resignação, talvez se torne um fardo quando volta a ser sentida. O livro termina com um calmo desespero de resignação.
Desenhado com um estilo gráfico muito pessoal, Na Prisão lê-se como um exorcizar acrítico de memórias e experiências. Registo gráfico autobiográfico, procura serenidade e não a crítica profunda. Mostra-nos que, para muitos, e talvez também para o autor, a opressão do cárcere é uma libertação do fardo do ser.
Artur Coelho
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Na Prisão
Autor: Kazuichi Hanawa
Editora: Sendai
Ano de edição: 2022
Páginas: 256 páginas, capa mole
Preço: 10,90€
Na Prisão
Autor: Kazuichi Hanawa
Editora: Sendai
Ano de edição: 2022
Páginas: 256 páginas, capa mole
Preço: 10,90€