ENTREVISTA EXCLUSIVA COM JOANA AFONSO
31-01-2022
Joana Afonso licenciou-se em Pintura, prosseguindo os estudos com um mestrado em Desenho, ambos pela FBAUL. Defendeu a sua dissertação, "Metodologias na banda desenhada: realização de um álbum de BD", em 2015. Em 2019, obteve o grau de doutorada pela sua tese " Multiplicidade narrativa em banda desenhada: a influência dos novos media". Desde 2013 que lecciona enquanto assistente convidada na FBAUL. Começou a desenhar quando era criança, influenciada por desenhos animados como o “Dragon Ball”. Além dos desenhos animados, a artista cita a banda desenhada franco-belga e o trabalho de Cyril Pedrosa como inspirações.
O seu primeiro trabalho de maior projecção foi o álbum "O Baile". Editado pela Kingpin Books em Outubro de 2012, o livro conta com o argumento de Nuno Duarte e esgotou a primeira tiragem. Em 2014, editou o seu primeiro álbum a solo, "Deixa-me Entrar", pela Polvo. Nesse ano, esteve em destaque como artista convidada do Amadora BD, assinando o cartaz do festival e garantindo uma exposição a solo.” – informação retirada da página Wikipédia sobre Joana Afonso.
+info: www.joanaafonso.com
Joana Afonso licenciou-se em Pintura, prosseguindo os estudos com um mestrado em Desenho, ambos pela FBAUL. Defendeu a sua dissertação, "Metodologias na banda desenhada: realização de um álbum de BD", em 2015. Em 2019, obteve o grau de doutorada pela sua tese " Multiplicidade narrativa em banda desenhada: a influência dos novos media". Desde 2013 que lecciona enquanto assistente convidada na FBAUL. Começou a desenhar quando era criança, influenciada por desenhos animados como o “Dragon Ball”. Além dos desenhos animados, a artista cita a banda desenhada franco-belga e o trabalho de Cyril Pedrosa como inspirações.
O seu primeiro trabalho de maior projecção foi o álbum "O Baile". Editado pela Kingpin Books em Outubro de 2012, o livro conta com o argumento de Nuno Duarte e esgotou a primeira tiragem. Em 2014, editou o seu primeiro álbum a solo, "Deixa-me Entrar", pela Polvo. Nesse ano, esteve em destaque como artista convidada do Amadora BD, assinando o cartaz do festival e garantindo uma exposição a solo.” – informação retirada da página Wikipédia sobre Joana Afonso.
+info: www.joanaafonso.com
ENTREVISTA
A animação e a banda desenhada franco-belga são as tuas principais portas de entrada para a banda desenhada. Recordas-te quando decidiste ser ilustradora e banda desenhista? Já agora, qual é o teu álbum preferido do Cyril Pedrosa?
É difícil precisar o momento certo, apesar de saber que sempre quis fazer algo relacionado com bonecos (inicialmente até dizia que queria ser animadora), talvez consiga dizer que foi já na faculdade, depois de ter experimentado fazer BD mais a sério, começando por participar em concursos e começar a conhecer autores de BD nacionais. Acredito que tenha sido uma conjugação de fatores que me levaram a abraçar este tipo de narrativa visual. Sobre o Cyril Pedrosa, novamente, escolha complicada, mas talvez escolha o “Três Sombras”, nem que seja porque foi o primeiro que conheci do autor. Foi ele que me despertou para os movimentos de leitura que se podem criar com o desenho, gerando a ilusão de algo animado e que flui de painel para painel e de página para página.
Existem alguns pintores nacionais que desenvolveram trabalho nos limites entre a pintura e a BD, como por exemplo o Eduardo Batarda. Durante a tua licenciatura em Pintura tentaste de algum modo desenvolver as tuas competências técnicas em BD nos projetos que produziste? Ou não havia muito espaço para isso?
Ainda tentei desenvolver BD no primeiro ano da licenciatura, mas ainda estava muito verde e as minhas soluções não foram bem recebidas, por isso desisti de o fazer por uns tempos. Só mais para o final do curso é que tive mais liberdade e coragem para fazer coisas que gostava, especialmente na disciplina de Desenho Digital, que estava aberta para todo o tipo de projetos e experiências. Apesar disso, curiosamente, não fiz BD, mas sim experiências em animação. Julgo que foi nesta disciplina e nas de Desenho mais tradicional que desenvolvi mais competências. Neste momento já existe uma maior abertura à Banda Desenhada; existem até disciplinas específicas para isso.
Como é que chegas à conclusão de que a banda desenhada era o medium ideal para te expressares?
Acho que foi a tal conjugação de acontecimentos, uma coisa levou à outra. Foram surgindo mais oportunidades na vida para fazer BD e eu acabei por agarrá-las e ficar afeiçoada a elas. Às tantas, se tivessem surgido oportunidades na animação, teria sido diferente, mas algo de que gosto na Banda Desenhada é que o nível de frustração é menor, os resultados finais conseguem-se mais rapidamente. Apesar disso, o bichinho da animação ainda aqui anda e tenho um respeito e admiração enormes por quem dedica a sua vida a esta arte.
Como descreverias o teu estilo gráfico? Que misturas resultam na tua linguagem plástica?
Não faço ideia! Não gosto muito de classificar o que faço nesses termos, também acho que nunca pensei muito nisso. Acho que vou fazendo e tentando gostar do que faço. Mas já ouvi pessoas falarem sobre o meu registo e dizerem que consegue ser fofo e “creepy” ao mesmo tempo (até que gosto desses adjetivos).
Venceste vários prémios ao longo dos anos, mas em 2013 recebes o galardão de Melhor Álbum Português no Amadora BD, com a bedê "O Baile”. Esse prémio tem um sabor especial ou há outro que seja mais importante para ti? Como decorreu o teu processo criativo para a construção deste primeiro álbum?
Sim, esse prémio tem um cantinho especial em mim. Foi o meu primeiro e ajudou-me bastante no que toca à visibilidade. Apesar de achar que foi um pouco cedo demais, tinha-me iniciado há pouco tempo como autora de BD “mais profissional”, não estava à espera de um prémio tão grande e consequente exposição retrospectiva no Amadora BD no ano seguinte. Sobre o processo criativo, daquilo que me lembro, foi uma constante aprendizagem, pois a experiência era pouca, ainda estava a apalpar terreno. Foram 2 anos nos quais cresci a todos os níveis, aliás, o álbum é um reflexo disso, ao ver as primeiras e as últimas páginas, conseguem-se ver várias fases do progresso. Podem afirmar falta de consistência, que acaba por ser, mas olho para esse trabalho de uma forma mais pessoal e gosto de ver o resultado e a evolução.
A tua ligação ao mundo académico é interessante e tens usado vários graus académicos superiores para desenvolver os teus projetos de banda desenhada. A tua dissertação de mestrado foi uma excelente ‘desculpa’ para publicar um álbum. Sentiste que precisavas dessa experiência para melhorar as tuas competências narrativas e gráficas ou a dissertação foi uma forma de colocar no papel e partilhar os conhecimentos que havias adquirido?
Foi um pouco das duas desculpas. Por um lado, queria fazer um álbum meu, por outro tinha de fazer o mestrado. Acabei por aprender com ambas as componentes e com a partilha do meu processo.
fala-nos um pouco sobre o projeto “Living Will”. Como foi trabalhar neste conjunto de narrativas curtas com o argumentista André Oliveira?
Foi um pouco montanha-russa. Foi um projeto de grande responsabilidade, especialmente por estar dividido em vários capítulos e ter de ser feito ao longo de muito tempo. Foi difícil a conjugação entre a vida pessoal e a parte de ter de cumprir a expectativa de fazer os livros com uma periodicidade aceitável. Mas é um projeto do qual tenho orgulho em ter participado, é também outro projeto que, quando olho para ele, vejo todos os momentos da minha vida (os maus e os bons) e a evolução durante os anos de produção.
A tua tese de doutoramento, um documento mais exigente, é sobre como os novos media influenciam a banda desenhada. Quais foram as principais conclusões a que chegaste e como é que essas influenciaram o teu processo criativo?
O que procurei nessa investigação, ao transformar e transportar uma narrativa visual em BD (mais convencional) para outros suportes, foi verificar que mudanças tinha eu de realizar para transmitir a mesma ideia. Existiu um maior foco, não só na história em si, mas também na noção da passagem do tempo e ritmos de leitura.
As principais considerações finais foram que cada meio tem as suas valências e especificidades, que têm de ser estudadas e trabalhadas caso a caso e que existe sempre a necessidade de tentativa-erro.
Da tua tese de doutoramento sai o projeto sobre a personagem epónima Zahna. Como foi escrever e desenhar este projeto e quantos álbuns estão planeados dentro deste universo ficcional?
Neste momento não estão planeados mais álbuns. Tenho uma ideia/sonho de continuar e complementar o álbum através, de histórias curtas de 20 e tal páginas (mais coisa menos coisa), com aventuras, aprofundamentos de personagens, etc. Mas penso que não vá passar de um sonho.
Como desenvolveste o worldbuilding para o storyworld de “Zahna”? Que referências e metodologias de trabalho usaste para criar este universo ficcional no género da fantasia?
Esse aspecto foi orgânico, fui criando o imaginário com o que me estava a "influenciar" no momento, que neste caso foi estar a ouvir muita música metal e estar a jogar o “Witcher 3: The Wild Hunt”. Juntamente com isto, foram muitos rabiscos nos diários gráficos e brincar com estas referências e inspirações.
No teu website disponibilizas um webcomic e uma experiência interativa na secção ‘Zahna Project’. Faz parte dos teus objetivos adaptar esta bedê para outros media, como o cinema ou os videojogos? Podemos contar com um franchise transmedia de Zahna num futuro próximo?
Isso era giro, mas não passa de um sonho. Talvez se ganhar o Euromilhões aconteça alguma coisa.
Foi um pouco das duas desculpas. Por um lado, queria fazer um álbum meu, por outro tinha de fazer o mestrado. Acabei por aprender com ambas as componentes e com a partilha do meu processo.
fala-nos um pouco sobre o projeto “Living Will”. Como foi trabalhar neste conjunto de narrativas curtas com o argumentista André Oliveira?
Foi um pouco montanha-russa. Foi um projeto de grande responsabilidade, especialmente por estar dividido em vários capítulos e ter de ser feito ao longo de muito tempo. Foi difícil a conjugação entre a vida pessoal e a parte de ter de cumprir a expectativa de fazer os livros com uma periodicidade aceitável. Mas é um projeto do qual tenho orgulho em ter participado, é também outro projeto que, quando olho para ele, vejo todos os momentos da minha vida (os maus e os bons) e a evolução durante os anos de produção.
A tua tese de doutoramento, um documento mais exigente, é sobre como os novos media influenciam a banda desenhada. Quais foram as principais conclusões a que chegaste e como é que essas influenciaram o teu processo criativo?
O que procurei nessa investigação, ao transformar e transportar uma narrativa visual em BD (mais convencional) para outros suportes, foi verificar que mudanças tinha eu de realizar para transmitir a mesma ideia. Existiu um maior foco, não só na história em si, mas também na noção da passagem do tempo e ritmos de leitura.
As principais considerações finais foram que cada meio tem as suas valências e especificidades, que têm de ser estudadas e trabalhadas caso a caso e que existe sempre a necessidade de tentativa-erro.
Da tua tese de doutoramento sai o projeto sobre a personagem epónima Zahna. Como foi escrever e desenhar este projeto e quantos álbuns estão planeados dentro deste universo ficcional?
Neste momento não estão planeados mais álbuns. Tenho uma ideia/sonho de continuar e complementar o álbum através, de histórias curtas de 20 e tal páginas (mais coisa menos coisa), com aventuras, aprofundamentos de personagens, etc. Mas penso que não vá passar de um sonho.
Como desenvolveste o worldbuilding para o storyworld de “Zahna”? Que referências e metodologias de trabalho usaste para criar este universo ficcional no género da fantasia?
Esse aspecto foi orgânico, fui criando o imaginário com o que me estava a "influenciar" no momento, que neste caso foi estar a ouvir muita música metal e estar a jogar o “Witcher 3: The Wild Hunt”. Juntamente com isto, foram muitos rabiscos nos diários gráficos e brincar com estas referências e inspirações.
No teu website disponibilizas um webcomic e uma experiência interativa na secção ‘Zahna Project’. Faz parte dos teus objetivos adaptar esta bedê para outros media, como o cinema ou os videojogos? Podemos contar com um franchise transmedia de Zahna num futuro próximo?
Isso era giro, mas não passa de um sonho. Talvez se ganhar o Euromilhões aconteça alguma coisa.
Em 2020 autopublicas “Bestiário de Isa – Parte I”, vencedor do prémio de Melhor Fanzine/Publicação Independente no Amadora BD 2021. Tens partilhado o processo criativo online para que os leitores possam aceder a informação sobre o projeto. Como tem sido esse processo de partilha e quando sai a parte II?
O processo agora tem estado parado, existiu uma altura que tinha um Patreon, no qual partilhava as páginas que ia fazendo, mas fiquei sem tempo para o fazer de forma consistente e abandonei essa partilha. Quanto ao futuro desta história, já não vai ser publicada em partes, mas sim num álbum através da editora A Seita.
Um fenómeno interessante que tem vindo a ganhar tração é o da produção de bandas desenhadas digitais para a Internet ou de projetos bedéfilos feitos de propósito para a Internet (webcomics). O que achas deste fenómeno e quais são as bedês online que recomendas?
Acho espetacular existir a liberdade de publicação sem ter a necessidade de ter um editor por trás ou ter de pagar para imprimir alguns exemplares, já que nem todos os autores conseguem fazer esse investimento. Para além de ser livre, é um suporte que consegue juntar formas de fazer BD que nunca seriam possíveis nos suportes analógicos, com animações e até som, roçando os limites do que pode ser considerado BD e animação (eu gosto dessas misturas). Sobre recomendações de webcomics, gostaria de ter algo concreto a apontar, não estou a seguir nenhuma em especial, contudo, posso dizer que tenho gostado bastante de acompanhar as BDs que a Joana Mosi vai publicando no Patreon, ou mesmo o webcomic que o André Pereira tem publicado no instagram todos os domingos.
Que bedês andas a ler agora e que autores segues com mais atenção?
Neste momento estou a portar-me mal nesse campo, tenho daqui a nada uma estante de livros à espera de serem lidos e não consigo arranjar paz de espírito/tempo para os ler. Talvez seja mais fácil falar dos autores que estou a seguir e tenho livros à minha espera, destacando o Jordi Lafebre, Bertrand Gatignol, Núria Tamarit, Zao Dao, Jillian Tamaki, Tillie Walden.
O que achas da evolução que a banda desenhada portuguesa teve nos últimos anos e, na tua perspetiva de profissional na área, o que é que se pode fazer melhor? Na perspetiva de professora como é que estamos em termos de ‘fornadas’ de futuros banda desenhistas?
Infelizmente as minhas perspectivas sobre a BD como “profissão” não são as melhores e não estou a ver de que forma é que o cenário possa mudar. Os anos passam e é impossível considerar viver da BD em Portugal, passando ainda pelo amor à camisola e sacrifício. O que não são boas notícias para os futuros banda desenhistas, o que é pena, pois vejo muito boas e quentes fornadas a sair.
Fazes parte do coletivo The Lisbon Studio. Que importância teve e tem tido esta coletividade na tua vida pessoal e profissional?
Neste momento já não faço parte do The Lisbon Studio, mas foi uma parte muito importante na minha vida, pessoal e profissional. Estive ao pé de grandes artistas, aprendi com eles e deram-me grandes oportunidades e também amizades. Terá sempre um lugar especial em mim.
Podemos contar com um pós-doc num futuro próximo associado a um projeto de BD? Que projetos de banda desenhada andas a desenvolver neste momento?
Não estou a pensar em pós-docs. Neste momento estou a fazer o Bestiário de Isa para, esperemos, ver a luz do dia este ano.
Entrevistador: Marco Fraga Silva
Artigo Web: Sérgio Santos |