RESENHA BD
Apocryphus Vo. 3: Femme Power
Coordenação de Miguel Jorge
2018-11-20
Pode parecer estranho vir falar aqui da Apocryphus. É algo do estilo vir à H-alt falar da concorrência. Na verdade, não creio que estes projetos sejam concorrentes. Nem o mercado português tem esse tipo de dimensão, nem a comunidade de fãs e criadores me parece que funcione nessas lógicas, dando ou tirando algumas rivalidades.
Para mais, há uma questão de focalização. A H-alt dá espaço às vozes mais novas da banda desenhada. A Apocryphus publica veteranos ou autores mais experientes, ligados à banda desenhada embora, because life happens, não sejam dela praticantes assíduos. No ecossistema da BD portuguesa, ambas têm o seu espaço, complementam-se, e são de certa forma a mesma coisa: um modo de publicação mais avançado que o fanzine, ambicioso e a dar voz aos criadores.
Costumo zurzir no editor da Apocryhus por nunca mais nos brindar com uma edição temática dedicada à Ficção Científica. Mas estou a ser injusto. Desde o primeiro volume que os temas desta revista têm servido para contar boas histórias de FC. Não é o seu tema central, mas a faísca para a imaginação tem ido por estes caminhos.
Este volume não é exceção, e o seu tema é muito pertinente. Basta ir a uma convenção, assistir a painéis, ver os lançamentos, onde os criadores se reúnem, para se ficar com a sensação que a BD é um clube de salsichas (e se olharmos bem, não é só aqui que isso se nota no mundo cultural). Com o tema Femme Power, a Apocryphus cria uma edição em que muda um pouco isso. Gostei do editorial de Miguel Jorge, que espelha a ideia de não ser um manifesto pela igualdade de género por ser absurdo que isto seja, nos dias de hoje, ainda uma questão. Mas de facto é, ainda e infelizmente, uma questão. Esta não é uma edição exclusivamente escrita e ilustrada por mulheres, mas note-se que a Apocryphus tem sido consistente nisso. O desafio foi o de é centrar as histórias no olhar feminino e diria que foi conseguido.
Pode parecer estranho vir falar aqui da Apocryphus. É algo do estilo vir à H-alt falar da concorrência. Na verdade, não creio que estes projetos sejam concorrentes. Nem o mercado português tem esse tipo de dimensão, nem a comunidade de fãs e criadores me parece que funcione nessas lógicas, dando ou tirando algumas rivalidades.
Para mais, há uma questão de focalização. A H-alt dá espaço às vozes mais novas da banda desenhada. A Apocryphus publica veteranos ou autores mais experientes, ligados à banda desenhada embora, because life happens, não sejam dela praticantes assíduos. No ecossistema da BD portuguesa, ambas têm o seu espaço, complementam-se, e são de certa forma a mesma coisa: um modo de publicação mais avançado que o fanzine, ambicioso e a dar voz aos criadores.
Costumo zurzir no editor da Apocryhus por nunca mais nos brindar com uma edição temática dedicada à Ficção Científica. Mas estou a ser injusto. Desde o primeiro volume que os temas desta revista têm servido para contar boas histórias de FC. Não é o seu tema central, mas a faísca para a imaginação tem ido por estes caminhos.
Este volume não é exceção, e o seu tema é muito pertinente. Basta ir a uma convenção, assistir a painéis, ver os lançamentos, onde os criadores se reúnem, para se ficar com a sensação que a BD é um clube de salsichas (e se olharmos bem, não é só aqui que isso se nota no mundo cultural). Com o tema Femme Power, a Apocryphus cria uma edição em que muda um pouco isso. Gostei do editorial de Miguel Jorge, que espelha a ideia de não ser um manifesto pela igualdade de género por ser absurdo que isto seja, nos dias de hoje, ainda uma questão. Mas de facto é, ainda e infelizmente, uma questão. Esta não é uma edição exclusivamente escrita e ilustrada por mulheres, mas note-se que a Apocryphus tem sido consistente nisso. O desafio foi o de é centrar as histórias no olhar feminino e diria que foi conseguido.
Esta edição começa com uma entrevista. Sara Leal é a ilustradora destacada, com uma estética entre a plasticidade da pintura e a influência visual Disney, que revela na entrevista. É a autora da bucólica ilustração de capa. As histórias de Banda Desenhada arrancam com Scouting for Girls, com argumento e ilustração de Fernando Lucas, uma história eficaz com contornos de FC distópica, com alguns potentes momentos visuais.
Com argumento de Keith Cunningham e ilustração de Miguel Jorge, Os Níveis Inferiores é um momento de FC pura, onde os esforços femininos colocam a nu as tensões que se vivem dentro de uma nave geracional a caminho de uma distante futura colónia. Segue-se Suor e Aço, com argumento de João Oliveira, ilustração de Diana Andrade e cores de Mariana Lopes, uma intrigante variação sobre a fantasia de capa e espada. Está longe de passados míticos, mas retrata a odisseia de uma guerreira num combate desportivo de esgrima.
Em Azul de Mariana Flores lemos uma história intimista sobre o processo criativo, com um visual espantoso. Segue-se uma narrativa onde mitos e futuros Cyberpunk colidem em A Cura, de Maria Lima e Ana Varela.
Miguel Montenegro aborda a BD com FC em fina ironia escatológica (hey, é um padrão, vão ler o que ele tem editado noutras antologias e percebem) e o traço de alguém que trabalhou para uma major dos comics. Os seus argumentos têm sempre algo de orwelliano cruzado com freudianismo, e Femme Power não é exceção.
Os Lobos de White Mist, escrito por Inocência Dias e Daniel Lopes, são talvez as páginas menos boas da apocryphus. A história cobre demasiadas coisas num curto espaço, e na ilustração percebe-se que ainda há muito espaço para o ilustrador crescer. O Mito da Criação, com argumento de Sofia Freire, ilustração de Felipe Coelho e cores de Fernando Madeira, encerra com chave de ouro esta Apocryphus. Novamente FC é o tema subjacente, e a história é uma clássica libertação de uma tirania distópica de costumes, em que os que nela vivem nem se apercebem que pode haver alternativas.
Ao longo das suas três edições, a Apocryphus tem revelado uma grande consistência. Desafia criadores a escrever e ilustrar histórias originais, sempre com um marcado critério de qualidade. Nota-se da parte do editor um esforço constante no sentido de criar mais um espaço de publicação de banda desenhada portuguesa, com edição criteriosa e cuidada. Este terceiro volume mantém o excelente nível a que já nos habituou.
Artur Coelho
Com argumento de Keith Cunningham e ilustração de Miguel Jorge, Os Níveis Inferiores é um momento de FC pura, onde os esforços femininos colocam a nu as tensões que se vivem dentro de uma nave geracional a caminho de uma distante futura colónia. Segue-se Suor e Aço, com argumento de João Oliveira, ilustração de Diana Andrade e cores de Mariana Lopes, uma intrigante variação sobre a fantasia de capa e espada. Está longe de passados míticos, mas retrata a odisseia de uma guerreira num combate desportivo de esgrima.
Em Azul de Mariana Flores lemos uma história intimista sobre o processo criativo, com um visual espantoso. Segue-se uma narrativa onde mitos e futuros Cyberpunk colidem em A Cura, de Maria Lima e Ana Varela.
Miguel Montenegro aborda a BD com FC em fina ironia escatológica (hey, é um padrão, vão ler o que ele tem editado noutras antologias e percebem) e o traço de alguém que trabalhou para uma major dos comics. Os seus argumentos têm sempre algo de orwelliano cruzado com freudianismo, e Femme Power não é exceção.
Os Lobos de White Mist, escrito por Inocência Dias e Daniel Lopes, são talvez as páginas menos boas da apocryphus. A história cobre demasiadas coisas num curto espaço, e na ilustração percebe-se que ainda há muito espaço para o ilustrador crescer. O Mito da Criação, com argumento de Sofia Freire, ilustração de Felipe Coelho e cores de Fernando Madeira, encerra com chave de ouro esta Apocryphus. Novamente FC é o tema subjacente, e a história é uma clássica libertação de uma tirania distópica de costumes, em que os que nela vivem nem se apercebem que pode haver alternativas.
Ao longo das suas três edições, a Apocryphus tem revelado uma grande consistência. Desafia criadores a escrever e ilustrar histórias originais, sempre com um marcado critério de qualidade. Nota-se da parte do editor um esforço constante no sentido de criar mais um espaço de publicação de banda desenhada portuguesa, com edição criteriosa e cuidada. Este terceiro volume mantém o excelente nível a que já nos habituou.
Artur Coelho
Apocryphus vol. 3: Femme Power
Editor: Miguel Jorge
Editora: MigHell Publishing
Ano de edição: 2018
Páginas: 104, capa mole
Preço: 13€