RESENHA BD
Umbigo do Mundo Vol. 1: Alma Mãe
18-10-2021
Devo confessar a minha total incapacidade de ser isento ao avaliar este livro. Não por conhecer os autores, algo que é inescapável num meio pequeno (mas grande em ideias) como o nosso. Sendo conhecedor dos seus trabalhos anteriores, só podia esperar que este livro fosse uma excelente proposta de leitura, assumidamente de ficção científica.
Do meu ponto de vista de leitor, vejo Carlos Silva como a voz mais promissora para assegurar que a literatura de ficção científica tenha, bem, perdoem-me a piada seca, um futuro em Portugal. Tenho visto muitos potenciais autores a ir e vir, lançando contos e livros, mas a depressa desvanecerem-se, porque a vida acontece e por cá os sonhos literários são sempre complicados de manter. Algo que não acontece a este resiliente autor, que mantém a sua produção literária, dinamiza projetos de divulgação, é a força motriz de concursos literários e (bolas, que só de listar isto já estou a ficar cansado) ainda mantém uma editora independente que dá espaço a vozes novas e veteranas. O seu romance Anjos é uma das mais surpreendentes obras da FC portuguesa recente.
Já Penim Loureiro é um criador veterano, que tive a oportunidade de conhecer com a edição de Cidade Suspensa. Foi aí que descobri o seu traço extraordinário, realista, rigoroso, mas ao mesmo tempo solto e imaginativo. Bem como o seu uso da cor, em vinhetas sempre lustrosas e luminosas. Este autor iniciou-se na BD no final dos anos 80, se não me falha a memória do que tem observado (nessa altura, eu ainda não estava a prestar a atenção a estes campos) e regressou à edição em 2014, depois de um longo hiato. Deslumbrante é a palavra que melhor descreve o seu trabalho gráfico.
O que esperar deste Umbigo do Mundo? Quem conhece a obra destes dois autores suspeita que o livro esteja no cruzamento das suas ideias e estéticas. Esperem futuros imaginados, muita ação, personagens intrigantes e, repetindo-me, deslumbres visuais.
Devo confessar a minha total incapacidade de ser isento ao avaliar este livro. Não por conhecer os autores, algo que é inescapável num meio pequeno (mas grande em ideias) como o nosso. Sendo conhecedor dos seus trabalhos anteriores, só podia esperar que este livro fosse uma excelente proposta de leitura, assumidamente de ficção científica.
Do meu ponto de vista de leitor, vejo Carlos Silva como a voz mais promissora para assegurar que a literatura de ficção científica tenha, bem, perdoem-me a piada seca, um futuro em Portugal. Tenho visto muitos potenciais autores a ir e vir, lançando contos e livros, mas a depressa desvanecerem-se, porque a vida acontece e por cá os sonhos literários são sempre complicados de manter. Algo que não acontece a este resiliente autor, que mantém a sua produção literária, dinamiza projetos de divulgação, é a força motriz de concursos literários e (bolas, que só de listar isto já estou a ficar cansado) ainda mantém uma editora independente que dá espaço a vozes novas e veteranas. O seu romance Anjos é uma das mais surpreendentes obras da FC portuguesa recente.
Já Penim Loureiro é um criador veterano, que tive a oportunidade de conhecer com a edição de Cidade Suspensa. Foi aí que descobri o seu traço extraordinário, realista, rigoroso, mas ao mesmo tempo solto e imaginativo. Bem como o seu uso da cor, em vinhetas sempre lustrosas e luminosas. Este autor iniciou-se na BD no final dos anos 80, se não me falha a memória do que tem observado (nessa altura, eu ainda não estava a prestar a atenção a estes campos) e regressou à edição em 2014, depois de um longo hiato. Deslumbrante é a palavra que melhor descreve o seu trabalho gráfico.
O que esperar deste Umbigo do Mundo? Quem conhece a obra destes dois autores suspeita que o livro esteja no cruzamento das suas ideias e estéticas. Esperem futuros imaginados, muita ação, personagens intrigantes e, repetindo-me, deslumbres visuais.
Talvez o lado negativo do livro seja a sua inconclusividade. A história está pensada e planeada para três volumes, o que significa que chegamos ao fim deste livro e nada se encerra, está tudo em aberto. Algo que por cá não é muito habitual, apostar numa visão de longo prazo, numa obra que se complete em vários episódios futuramente editados. Ao chegar ao final do livro, ficou-me a vontade de continuar a ler a história.
O mundo ficcional de Umbigo do Mundo é deliciosamente pós-apocalíptico, numa Europa desagregada e fustigada pelo aquecimento global. Os estados-nação desagregaram-se, há uma clara divisão entre um poderoso norte e um sul que sobrevive nas ruínas, divisão reforçada por uma fronteira física. As populações vivem entre ruínas, ao sabor dos jogos de poder de elites que habitam os topos luxuosos das cidades que restam, que seguram o seu poder com forças militares implacáveis.
E, no meio disto, Alma, uma estranha mulher aparentemente atemporal, que acompanhada de um andróide e um mabeco (confesso que esta, não percebi de todo, mas há imenso que este primeiro livro deixa em aberto), que atrapalha as forças que dirigem este mundo. Em parte, pelo seu caráter de atrator estranho, como ser que representa diferentes e eventuais linhas temporais.
Esta é uma história de futurismo pós-apocalíptico, entre ciberculturas decaídas e teoria do caos, de poderes opressivos e as forças inesperadas que representam réstias de esperança. O traço limpo e luminoso de Penim dá a este deprimente futuro um lado lustroso, estranhamente luxuriante. Predominância de luminosidade e elegância nas ruínas não são a habitual estética pesada e obscura que se associa ao tema. Mas esta inversão conceptual não surpreende, está inerente ao trabalho e estéticas desta dupla de criadores. O livro deixa imensas pontas soltas, o ser incompleto é assumido, e resta-nos, como leitores, ter a paciência de esperar pelos próximos volumes. Suspeito que vá valer a pena.
Artur Coelho
O mundo ficcional de Umbigo do Mundo é deliciosamente pós-apocalíptico, numa Europa desagregada e fustigada pelo aquecimento global. Os estados-nação desagregaram-se, há uma clara divisão entre um poderoso norte e um sul que sobrevive nas ruínas, divisão reforçada por uma fronteira física. As populações vivem entre ruínas, ao sabor dos jogos de poder de elites que habitam os topos luxuosos das cidades que restam, que seguram o seu poder com forças militares implacáveis.
E, no meio disto, Alma, uma estranha mulher aparentemente atemporal, que acompanhada de um andróide e um mabeco (confesso que esta, não percebi de todo, mas há imenso que este primeiro livro deixa em aberto), que atrapalha as forças que dirigem este mundo. Em parte, pelo seu caráter de atrator estranho, como ser que representa diferentes e eventuais linhas temporais.
Esta é uma história de futurismo pós-apocalíptico, entre ciberculturas decaídas e teoria do caos, de poderes opressivos e as forças inesperadas que representam réstias de esperança. O traço limpo e luminoso de Penim dá a este deprimente futuro um lado lustroso, estranhamente luxuriante. Predominância de luminosidade e elegância nas ruínas não são a habitual estética pesada e obscura que se associa ao tema. Mas esta inversão conceptual não surpreende, está inerente ao trabalho e estéticas desta dupla de criadores. O livro deixa imensas pontas soltas, o ser incompleto é assumido, e resta-nos, como leitores, ter a paciência de esperar pelos próximos volumes. Suspeito que vá valer a pena.
Artur Coelho
Umbigo do Mundo Vol. 1: Alma Mãe
Autor: Carlos Silva, Penim Loureiro
Editora: A Seita/Comic Heart
Ano de edição: 2021
Páginas: 80 páginas, capa dura
Preço: 14€