RESENHA BD
A Raposa e o Pequeno Tanuki, de Mi Tagawa
13-09-2021
O crescimento do gosto pela leitura de mangá por cá está a trazer boas consequências. Lentamente, a oferta de banda desenhada japonesa nas editoras cresce, e começa a divergir do duopólio mangá erudito/mangá juvenil que era o normal, cá. Notem que não estou a menorizar essas edições. Também são interessantes e divertidas. E são fundamentais para que o gosto pela vertente japonesa da banda desenhada cresça e se divulgue, cativando tanto aqueles que chegam através do anime, como fãs de BD que aproveitam para o descobrir.
Para lá da oferta tradicional da Devir, que na prática criou este nicho de mercado, temos novas editoras, que para já me parecem algo fugazes. A JBC trouxe obras interessantes antes de passar ao silêncio (terão achado o mercado português demasiado redutor?). A Sendai, cuja distribuição em livrarias me parece algo incerta, em poucos meses já editou dois títulos muito inesperados no contexto português. Até a irreverente Chili Com Carne adicionou mangá visualmente experimental, como não poderia deixar de ser, ao seu catálogo. A Midori, outra pequena editora que se parece especializar em mangás criados por autores brasileiros, oferece-nos a belíssima surpresa que é este A Raposa e o Pequeno Tanuki, escrito e desenhado pela japonesa Mi Tagawa.
A Raposa e o Pequeno Tanuki é uma belíssima fábula, que se inspira no riquíssimo imaginário das tradições japonesas para nos trazer uma história de sensibilidade muito apurada. Mi Tagawa dá-nos a conhecer os animais divinos japoneses, criaturas que podem servir deuses específicos ou serem mais selvagens.
O crescimento do gosto pela leitura de mangá por cá está a trazer boas consequências. Lentamente, a oferta de banda desenhada japonesa nas editoras cresce, e começa a divergir do duopólio mangá erudito/mangá juvenil que era o normal, cá. Notem que não estou a menorizar essas edições. Também são interessantes e divertidas. E são fundamentais para que o gosto pela vertente japonesa da banda desenhada cresça e se divulgue, cativando tanto aqueles que chegam através do anime, como fãs de BD que aproveitam para o descobrir.
Para lá da oferta tradicional da Devir, que na prática criou este nicho de mercado, temos novas editoras, que para já me parecem algo fugazes. A JBC trouxe obras interessantes antes de passar ao silêncio (terão achado o mercado português demasiado redutor?). A Sendai, cuja distribuição em livrarias me parece algo incerta, em poucos meses já editou dois títulos muito inesperados no contexto português. Até a irreverente Chili Com Carne adicionou mangá visualmente experimental, como não poderia deixar de ser, ao seu catálogo. A Midori, outra pequena editora que se parece especializar em mangás criados por autores brasileiros, oferece-nos a belíssima surpresa que é este A Raposa e o Pequeno Tanuki, escrito e desenhado pela japonesa Mi Tagawa.
A Raposa e o Pequeno Tanuki é uma belíssima fábula, que se inspira no riquíssimo imaginário das tradições japonesas para nos trazer uma história de sensibilidade muito apurada. Mi Tagawa dá-nos a conhecer os animais divinos japoneses, criaturas que podem servir deuses específicos ou serem mais selvagens.
Senzo é um desses animais, uma raposa derrotada pelos restantes mensageiros dos deuses após uma rebelião e que, 300 anos depois, é liberta do seu castigo. Mas a liberdade não lhe trará redenção imediata ou perdão. Pelo contrário, a liberdade trará consigo um novo castigo, uma forma que os deuses benévolos têm de reformar o espírito violento da raposa. Terá de tomar conta de um pequeno guaxinim, jovem animal que manifestou poderes sobrenaturais. A orgulhosa raposa, desprovida de poderes e usando um colar que a castiga com dores sempre que tenta desobedecer à imposição dos deuses, terá de educar o pequeno guaxinim.
Não é difícil perceber por onde vai esta história. Segue a clássica dicotomia entre um personagem mais velho, experiente e ranzinza, que é forçado de aturar um personagem novo, inexperiente e otimista. Espera-se um percurso de aprendizagem para ambos. Mas se o jovem guaxinim terá de ser ajudado a conhecer as suas capacidades e o mundo que o rodeia, o maior ganho será o da raposa, que em contacto com o jovem que tem de proteger irá suavizar o seu duro coração. Até porque, nos mitos, quando estes animais revelam os seus poderes são ostracizados pelos seus familiares, o que significa que a sensação de perda e isolamento que o pequeno guaxinim começa a sentir sempre que pensa na família, é na verdade a semente do ódio que a raposa vota ao mundo.
Esta raposa pode não ser raposeta matreira, fagueira, lambisqueira como a Salta-Pocinhas de Aquilino, ou esperta e trapaceira como a Renart medieval. Mas as raposas japonesas, pelos vistos, também são senhoras de si e recusam a subserviência. É interessante notar esta transversalidade cultural.
A missão que Senzo terá de cumprir, relutante, de educar o jovem tanuki nas sendas do mundo é apadrinhada por outra raposa, benévola, que representa a deusa que castigou Senzo. À sua volta outros animais místicos, lobos, cães, galos, toupeiras, ganham forma e cruzam as fronteiras entre os mundos.
A história é tocante, e a ilustração soberba. Pelo pouco que consegui ler sobre a autora, ela é conhecida pelas ilustrações naturalistas que faz das tradições nipónicas, e isso nota-se não só nalgumas ilustrações do livro, como no traço e composição gráfica da obra. Esta fábula onde os animais falam, protegem e são arautos de deuses é uma leitura deliciosa, daquelas que terminamos com um sorriso nos lábios.
Artur Coelho
Não é difícil perceber por onde vai esta história. Segue a clássica dicotomia entre um personagem mais velho, experiente e ranzinza, que é forçado de aturar um personagem novo, inexperiente e otimista. Espera-se um percurso de aprendizagem para ambos. Mas se o jovem guaxinim terá de ser ajudado a conhecer as suas capacidades e o mundo que o rodeia, o maior ganho será o da raposa, que em contacto com o jovem que tem de proteger irá suavizar o seu duro coração. Até porque, nos mitos, quando estes animais revelam os seus poderes são ostracizados pelos seus familiares, o que significa que a sensação de perda e isolamento que o pequeno guaxinim começa a sentir sempre que pensa na família, é na verdade a semente do ódio que a raposa vota ao mundo.
Esta raposa pode não ser raposeta matreira, fagueira, lambisqueira como a Salta-Pocinhas de Aquilino, ou esperta e trapaceira como a Renart medieval. Mas as raposas japonesas, pelos vistos, também são senhoras de si e recusam a subserviência. É interessante notar esta transversalidade cultural.
A missão que Senzo terá de cumprir, relutante, de educar o jovem tanuki nas sendas do mundo é apadrinhada por outra raposa, benévola, que representa a deusa que castigou Senzo. À sua volta outros animais místicos, lobos, cães, galos, toupeiras, ganham forma e cruzam as fronteiras entre os mundos.
A história é tocante, e a ilustração soberba. Pelo pouco que consegui ler sobre a autora, ela é conhecida pelas ilustrações naturalistas que faz das tradições nipónicas, e isso nota-se não só nalgumas ilustrações do livro, como no traço e composição gráfica da obra. Esta fábula onde os animais falam, protegem e são arautos de deuses é uma leitura deliciosa, daquelas que terminamos com um sorriso nos lábios.
Artur Coelho
A Raposa e o Pequeno Tanuki
Autor: Mi Tagawa
Editora: Midori
Ano de edição: 2020
Páginas: 168 páginas, capa mole
Preço: 10€