RESENHA BD
A Jornada de Kappa, de Imiri Sakabashira
23-10-2021
O segundo lançamento da promissora editora Sendai é muito surpreendente. Se já foi um agitar de águas editar por cá uma obra como Panorama do Terror, com o seu potencial controverso e exposição de leitores habituados ao mangá pop ou erudito a algo que assume o extravasar de limites, a sua nova oferta agita ainda mais. Não por ser controversa. Suspeitava que depois de Hino, o passo lógico seria continuar o trajecto pelo lado mais escatológico do horror japonês e trazer-nos Suehiro Maruo ou outros nomes igualmente fascinantes e revoltantes. Não foi esse o caminho, o que sinaliza que a verdadeira aposta desta editora é trazer-nos o tipo de mangaka que sai mesmo fora do mainstream.
E ainda bem. Quebra a monotonia do mangá para adolescentes, ou a adulação aos seus autores mais eruditos. Ler os pop é divertido, mas é o equivalente nutritivo de uma dieta só de hambúrgueres. Focar nos eruditos, que nos legaram trabalhos que ultrapassam o lado lúdico do género, deixa de parte o resto do espectro. É aqui que a Sendai está a apostar, nos autores fímbria do espectro, criadores fascinantes de obras que não se enquadram no mainstream, pelo seu lado independente ou pelos seus extremos.
O segundo lançamento da promissora editora Sendai é muito surpreendente. Se já foi um agitar de águas editar por cá uma obra como Panorama do Terror, com o seu potencial controverso e exposição de leitores habituados ao mangá pop ou erudito a algo que assume o extravasar de limites, a sua nova oferta agita ainda mais. Não por ser controversa. Suspeitava que depois de Hino, o passo lógico seria continuar o trajecto pelo lado mais escatológico do horror japonês e trazer-nos Suehiro Maruo ou outros nomes igualmente fascinantes e revoltantes. Não foi esse o caminho, o que sinaliza que a verdadeira aposta desta editora é trazer-nos o tipo de mangaka que sai mesmo fora do mainstream.
E ainda bem. Quebra a monotonia do mangá para adolescentes, ou a adulação aos seus autores mais eruditos. Ler os pop é divertido, mas é o equivalente nutritivo de uma dieta só de hambúrgueres. Focar nos eruditos, que nos legaram trabalhos que ultrapassam o lado lúdico do género, deixa de parte o resto do espectro. É aqui que a Sendai está a apostar, nos autores fímbria do espectro, criadores fascinantes de obras que não se enquadram no mainstream, pelo seu lado independente ou pelos seus extremos.
A Jornada de Kappa destila-se em poucas frases. É a história de uma menina que tem de sair de casa para procurar trabalho. O emprego que encontra, por acidente, é trabalhar num submarino pirata tripulado por kappas, criaturas míticas do folclore japonês. Soa simples, não soa? Quase linear e infantil, a história de puxar a lágrima ao olho sobre uma jovem inocente forçada ao trabalho com criaturas rudes, para poder ajudar o pai desempregado, certo? Bem, se vos disser que o pai perdeu o emprego por se estar a transformar num sapo antropomórfico, já começam a perceber que linear e expectável não são adjetivos para qualificar esta obra.
De uma história simples, a um voo de fantasia. A partir desta premissa mergulhamos num intenso mundo onírico, onde não há linearidade narrativa. A história vai ao sabor de um imaginário que não procura a compreensão, onde as criaturas já de si estranhas da tradição nipónica se vão sucedendo no périplo da jovem. O traço, o estilo visual, é de uma infantilidade enganadora, surreal e num estilo muito pessoal. Toda esta conjugação funciona, o livro agarra-nos pelo seu fantástico onírico, onde a cada prancha há sempre algo que nos surpreende. A sua riqueza visual é enorme, não se esgota numa única leitura.
Este não é o mangá a que estamos habituados. Não tem o formalismo estilístico da vertente mais comercial, onde o estilo gráfico dos desenhadores é quase indistinguível. A Sendai, nesta edição, traz-nos o trabalho de Imiri Sakabashira, cuja carreira como mangaká (e não só, também mexe na música e pintura) segue o caminho do mangá independente. Este livro é experimental, onírico, sem compromissos. Uma poética transmutação pessoal das criaturas da tradição japonesa.
Artur Coelho
De uma história simples, a um voo de fantasia. A partir desta premissa mergulhamos num intenso mundo onírico, onde não há linearidade narrativa. A história vai ao sabor de um imaginário que não procura a compreensão, onde as criaturas já de si estranhas da tradição nipónica se vão sucedendo no périplo da jovem. O traço, o estilo visual, é de uma infantilidade enganadora, surreal e num estilo muito pessoal. Toda esta conjugação funciona, o livro agarra-nos pelo seu fantástico onírico, onde a cada prancha há sempre algo que nos surpreende. A sua riqueza visual é enorme, não se esgota numa única leitura.
Este não é o mangá a que estamos habituados. Não tem o formalismo estilístico da vertente mais comercial, onde o estilo gráfico dos desenhadores é quase indistinguível. A Sendai, nesta edição, traz-nos o trabalho de Imiri Sakabashira, cuja carreira como mangaká (e não só, também mexe na música e pintura) segue o caminho do mangá independente. Este livro é experimental, onírico, sem compromissos. Uma poética transmutação pessoal das criaturas da tradição japonesa.
Artur Coelho
A Jornada de Kappa
Autor: Imiri Sakabashira
Editora: Sendai
Ano de edição: 2021
Páginas: 208 páginas, capa mole
Preço: 10€