OS SUSPEITOS DO COSTUME
2016-12-20
No momento em que escrevo estas linhas, acabou de ser concluída a publicação nas bancas de Portugal de uma coleção de banda-desenhada compilando um dos mais aclamados comics norte-americanos do final do século XX. No topo das capas, por cima do título da série, está o nome do argumentista em letras grandes. Os nomes dos desenhadores, sem os quais estes livros certamente não seriam banda desenhada, aparecem em letras pequeninas no canto inferior direito. É triste perceber como, num meio de expressão eminentemente visual, o desenhador, que deveria ter a primazia do reconhecimento pelo seu contributo criativo, é cada vez mais relegado para segundo plano. Parece-me pertinente perguntar: a que se deve isso?
No momento em que escrevo estas linhas, acabou de ser concluída a publicação nas bancas de Portugal de uma coleção de banda-desenhada compilando um dos mais aclamados comics norte-americanos do final do século XX. No topo das capas, por cima do título da série, está o nome do argumentista em letras grandes. Os nomes dos desenhadores, sem os quais estes livros certamente não seriam banda desenhada, aparecem em letras pequeninas no canto inferior direito. É triste perceber como, num meio de expressão eminentemente visual, o desenhador, que deveria ter a primazia do reconhecimento pelo seu contributo criativo, é cada vez mais relegado para segundo plano. Parece-me pertinente perguntar: a que se deve isso?
Há uns tempos atrás, um desenhador nacional com trabalho publicado nas principais editoras do chamado mainstream norte-americano confessava-me que essas casas editoriais só não deixaram de usar desenhadores na criação das suas bandas-desenhadas porque ainda não foi inventado um software capaz de gerar imagens à altura dessa substituição. Dizia este desenhador que todas as decisões narrativas e criativas são definidas a priori por um comitê central de editores e escritores, sem grande espaço para a participação activa do desenhador enquanto agente criativo e narrador, relegando-o para o papel de mero ilustrador. O desabafo poderá parecer um pouco exagerado para o entusiasta mediano, aquele para quem a banda desenhada se resume apenas ao consumo de mais uma forma de entretenimento, ao hábito da coleção ou ao seguimento mais ou menos fanático de intellectual properties que dominam a corrente comercial do meio. Entusiastas que ignoram ou escolhem ignorar que esse mesmo aspecto "iconográfico" se deve em primeiro lugar ao trabalho das pessoas que as desenharam e em segundo à acção das poderosas máquinas de marketing e de merchandising dessas casas de edição ao longo de várias décadas de propaganda nos mais diversos media.
Ao longo das próximas edições desta coluna, procurarei explorar a importância do desenhador de banda desenhada, começando por analisar os diversos aspectos que contribuem para este clima onde o desenhador é visto cada vez mais como um parasita desafortunadamente necessário no processo de produção dos comics.
- O Desenhador Fantasma